Contrato de Trabalho e Créditos Dos Trabalhadores Na Insolvência

Quando o trabalhador é declarado insolvente, dispõe o Artigo 113.º do Código da Insolvência sob a epígrafe “Insolvência do trabalhador”, que a declaração de insolvência do trabalhador não suspende o seu contrato de trabalho. Logo, o contrato mantém-se em vigência sem qualquer tipo de melindre, nem pode o trabalhador sofrer qualquer tipo de consequências por força da situação.

Igualmente, nos casos em que é a entidade empregadora a ser declarada insolvente, a declaração judicial de insolvência do empregador também não faz cessar os contratos de trabalho de forma automática. Porquanto, dispõe o art.º 277.º, sobre a epigrafe “relações laborais” que os efeitos da declaração de insolvência relativamente a contratos de trabalho e à relação laboral regem-se exclusivamente pela lei aplicável ao contrato de trabalho.

Enquanto não for promovido o despedimento pela entidade empregadora, assinado um acordo ou concretizado o despedimento com justa causa é trabalhador e terá que se apresentar ao trabalho. Todavia, tendo salários em atraso, e não existindo perspectivas de melhoria da situação, o trabalhador pode sempre requerer a Suspensão do contrato de trabalho por falta de pagamento pontual da retribuição ou promover o seu despedimento unilateral.

Estão assim salvaguardados as relações laborais e os direitos dos trabalhadores quando se dá uma situação de insolvência este continua a ser trabalhador da empresa até que a sua situação seja definida (em regra, e nos casos em que se justifica, proceder-se ao despedimento colectivo ou entao, o despedimento opera com o encerramento da empresa no processo de insolvência). Pode até suceder que, na data da sentença, não tenha créditos a reclamar – o que não significa que não os venha a ter, decorrentes de possíveis indemnizações

Sendo o processo de insolvência uma execução universal, e afastada a possibilidade de recuperação numa das formas previstas na lei, o objectivo primordial do processo é liquidar o património do devedor e sua repartição pelos credores de acordo com as suas classes e preferências.

Estes pagamentos ocorrem após as reclamações de créditos efectuadas junto do Administrador Judicial, sendo precedidos por uma sentença de verificação e graduação de créditos que define quem e porque ordem vão ser distribuídos os valores existentes na massa insolvente – art.º 173.º do CIRE.

Sendo que, “…antes de proceder ao pagamento dos créditos sobre a insolvência, o administrador da insolvência deduz da massa insolvente os bens ou direitos necessários à satisfação das dívidas desta, incluindo as que previsivelmente se constituirão até ao encerramento do processo”…. só depois procede à distribuição do produto da venda pelos credores.  – cfr. Art.º 172/1 do CIRE.

Para o efeito, o Código de Insolvência e demais legislação avulsa estabelecem regras que priorizam os pagamentos a efectuar – prevendo algumas situações de grande complexidade.  Neste âmbito, e com frequência, temos a situação dos trabalhadores e respectiva graduação dos seus créditos.

Atendendo à sua natureza, os créditos laborais gozam de dois privilégios: Privilégio mobiliário geral e privilégio imobiliário especial, ambos previstos no artigo 333º, n.º 1, als. a) e b) do Código do Trabalho.

Durante muito tempo, discutiu-se se o privilégio imobiliário especial incidia sobre todos os imóveis que integravam o património do empregador/insolvente (afectos à sua actividade empresarial) ou se apenas o imóvel onde o trabalhador prestava a sua actividade.

Ou seja, vendido um imóvel quem recebe primeiro: os trabalhadores que nele exerciam funções ou todos os trabalhadores da empresa – por exemplo, os que trabalhavam noutro local, comerciais, ou os que se encontravam destacados.

Tem-se entendido, de forma unânime, que os créditos dos trabalhadores gozam de privilégio sobre o produto da venda de todos os bens apreendidos, independentemente do local onde exercem as suas funções.

Neste sentido, o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 8/2016, veio esclarecer que: “(…) Os trabalhadores gozam do privilégio sobre todos os imóveis que integram o património do empregador, afectos à sua actividade empresarial, e não apenas sobre o concreto imóvel onde exerceram funções; importa é que “a actividade laboral do trabalhador, qualquer que ela seja e independentemente do lugar específico onde é prestada, se desenvolva de forma conjugada e integrada na unidade empresarial, a ela umbilicalmente ligada…”.

Assim, nos termos do artigo 333.º, n.º 2, o crédito com privilégio mobiliário geral é graduado antes dos créditos referido no artigo 747.º, n.º 1, do Código Civil e o crédito com privilégio imobiliário especial é graduado antes dos créditos referido no artigo 748.º do Código Civil.

A título de exemplo, e não obstante o imóvel estar onerado com hipoteca, os créditos laborais devem ser graduados e pagos antes dos créditos hipotecários.

Luís M. Martins – Advogado