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Direito De Preferência em Prédio Urbano Em Propriedade Total
O artigo 1091.º do Código Civil, alterado pela lei 64/2018, de 29.10 que lhe aditou um n.º 8 e 9, teve como escopo terminar com a situação de desigualdade existente entre inquilinos de fracções autónomas (prédios em propriedade horizontal) e inquilinos de partes não autónomas (prédios em propriedade total).
Na prática, a alteração legal pretendeu “estender” o objeto de preferência a prédios não constituídos em propriedade horizontal nos casos de arrendamento para fins habitacionais.
Não obstante a intenção do legislador em proteger os inquilinos dos prédios em propriedade total, após a aprovação da lei um grupo de trinta e seis deputados da Assembleia da República, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 e na alínea f) do n.º 2 do artigo 281.º da Constituição da República Portuguesa, suscitaram a apreciação e declaração da inconstitucionalidade do n.º 8 do artigo 1091.º do Código Civil, na redacção dada pela Lei n.º 64/2018, de 29 de Outubro por entenderem que a norma em questão violava o artigo 62.º n.ºs 1 e 2 (Direito de Propriedade Privada), conjugado com o disposto no n.º 2 do artigo 18.º, todos da Constituição.
A questão veio a ser apreciada pelo Tribunal Constitucional por acórdão n.º 299/2020, tendo julgado inconstitucional com força obrigatória geral o n.º 8 do art.º 1091.º, do Código Civil, que dispunha que “No caso de contrato de arrendamento para fins habitacionais relativo a parte de prédio não constituído em propriedade horizontal, o arrendatário tem direito de preferência nos mesmos termos previstos para o arrendatário de fracção autónoma” [1].
A declaração da inconstitucionalidade com força obrigatória geral tem um valor normativo e uma força persuasiva equiparável à lei, pelo que, todos os Tribunais e todas as autoridades administrativas estão obrigados à sua aplicação produzindo efeitos desde a entrada em vigor da norma declarada inconstitucional e determina a repristinação das normas que, eventualmente, tenha revogado nos termos do artigo 282.º, nº 1 da Constituição.
No caso, a declaração de inconstitucionalidade não determinou a repristinação de qualquer norma, pois a norma declarada inconstitucional era inovadora, não tendo paralelo na anterior redacção do artigo 1091º do CCiv., dada pela Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro pois o nº 8 consagrou, pela primeira vez, o direito de preferência do arrendatário habitacional de parte de prédio não constituído em propriedade horizontal, quanto à quota-parte do prédio correspondente à permilagem do locado pelo valor proporcional dessa quota-parte face ao valor total da transmissão.
Atendendo à leitura do actual art.º 1091º do CC, o arrendatário habitacional de uma parte de um prédio urbano não constituído em propriedade horizontal não goza do direito legal de preferência na compra e venda do prédio, uma vez que esse direito apenas é reconhecido ao arrendatário de todo o prédio urbano.
Ou seja, não estando constituído em propriedade horizontal, não pode ser passível de autonomização material e objecto de negócio jurídico pois o preferente substitui-se na posição do comprador na compra e venda – que foi o todo…e não parte do prédio.
Como fundamenta acórdão do Tribunal Constitucional n.º 299/2020, se o local arrendado não for passível de individualização jurídica, sobre ele não pode incidir jus in re (artigo 408.º, n.º 2, do Código Civil), uma vez que só após a constituição da propriedade horizontal é que o arrendatário pode tornar-se proprietário exclusivo do local arrendado.
Todavia, porque o n.º 9.º do art.º 1091.º do Cod. Civil não foi afectado pela declaração de inconstitucionalidade, os inquilinos do imóvel para fins habitacionais, não sujeito ao regime da propriedade horizontal podem exercer direito de preferência em conjunto sobre a totalidade do imóvel em compropriedade dispondo a lei que:
“…9 – Caso o obrigado à preferência pretenda vender um imóvel não sujeito ao regime da propriedade horizontal, podem os arrendatários do mesmo, que assim o pretendam, exercer os seus direitos de preferência em conjunto, adquirindo, na proporção, a totalidade do imóvel em compropriedade…”.
[1] Declara, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma constante do n.º 8 do artigo 1091.º do Código Civil, na redacção dada pela Lei n.º 64/2018, de 29 de Outubro, por violação do n.º 1 do artigo 62.º, em conjugação com o n.º 2 do artigo 18.º, da Constituição. O Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 299/2020, pode ser consultado na integra em: https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20200299.html.
Luís M. Martins- Advogado