Estou Endividado e Não Consigo Pagar. E Agora?

Endividamento bate recordes…

Em Novembro de 2020 o Banco de Portugal anunciou um total de 742 mil milhões de euros de dívida, repartido entre particulares, empresas e Estado. Nas empresas, a dívida atingiu os 263 mil milhões de euros e nas famílias 141 mil milhões.

Em Setembro de 2021, Terminou o período das moratórias –as prestações devidas e não pagas rondarão acerca de 15% do total dos empréstimos das empresas – cerca de 11 mil milhões de euros

Começa a pairar a dúvida se o fim das moratórias não vai fazer disparar o incumprimento das famílias e das empresas….acabando por ter o efeito contrário – Para um em cada três portugueses o dinheiro não chega até ao fim do mês…!

Isto porque uma grande parte da população portuguesa está na estatística das execuções e penhoras.

O aumento das insolvências é apenas “a ponta do icebergue”. De acordo com a estatística*, em média, os portugueses ganham 900 euros, que não dá para pagar uma renda ou um crédito à habitação, alimentar e educar os filhos. Por isso recorrem ao “crédito”.

O endividamento das famílias portuguesas está relacionado com o crédito. Com ele, é  possível concretizar, no imediato, aquilo que só poderia ser feito volvido algum tempo e após acumulação de poupanças.

Ou, em muitas situações, para colmatar o montante que faz falta todos os meses agregado familiar…ou para pagar outros empréstimos numa aspiral de carrocel..

Recorrer ao crédito é um acto utilizado como recurso normal, que faz parte do quotidiano da generalidade das famílias e não se vive sem ele. O crédito vem facilitar esta engrenagem fazendo com que se utilize no imediato e se pague amanhã – um dia mais feliz. Mas a que preço?

O preço está à vista. Constata-se que a actual sociedade consumista e publicista do “compre agora, pague depois” e de fácil acesso ao credito nas suas mais diversificadas vertentes, teve como consequência inevitável o aumento dos riscos e efectivação do incumprimento (das famílias e das empresas). Chegadas ao incumprimento e impossibilidade de honrar as suas obrigações, e no caso concreto das pessoas singulares, estas podem recorrer ao “Plano de Pagamentos”, ao “O Processo Especial para Acordo de Pagamento (PEAP)” e à “exoneração do passivo restante – perdão das dívidas”.

As duas primeiras consubstanciam um plano de pagamentos (proposta) que é apresentado aos credores podendo prever entregas da casa ao banco, negociação dos empréstimos, taxas de juro etc. e, a terceira,  mais não é que a consagração no nosso ordenamento jurídico do principio do fresh start, segundo o qual, o devedor, pessoa singular e dotado de boa-fé, tem a possibilidade de se libertar do peso do passivo e recomeçar a sua vida de novo, independentemente de ter sido declarado insolvente.

A recuperação económico financeira das pessoas singulares/famílias pode assim ser obtida via judicial ou extrajudicial, com maior ou menor pagamentos aos credores e com ou sem declaração de insolvência (na insolvência, importa que as obrigações vencidas, pelas suas características, natureza e circunstancias relacionadas com o incumprimento, assumam significado no conjunto do passivo existente, revelando impotência de continuar a satisfazer a generalidade dos compromissos assumidos.)

Ao devedor é dada a oportunidade de apresentar um plano de pagamentos através dos diversos mecanismos legais e requerer a exoneração (perdão das dividas)  em simultâneo, caso aquele não venha a merecer acolhimento pelos credores. Para tal deverá, no próprio plano de pagamentos e no requerimento inicial, fazer constar expressamente que pretende valer-se da exoneração (perdão das dividas), caso o plano de pagamentos venha a ser rejeitado pelos credores.

Mas pesando todas estas possibilidades, a solução não é “viver feliz sem dívidas”, “fugir às responsabilidades” ou utilizar meios e esquemas para não pagar, sejam eles judiciais ou extra judiciais.

A Solução passa sempre por tentar pagar o que se deve, ou pelo menos tentar que assim seja de forma consciente e ponderada – por exemplo, propondo um plano com aquilo que se pode pagar e apelar ao bom senso dos credores. Este será um imperativo a que ninguém devia fugir, pois não ter esta consciência implica inverter outros valores, obrigações e direitos.

Só depois, e se não conseguir, então avançar para uma medida mais forte, como seja a insolvência e um possível perdão das dividas por incapacidade de pagar e tentar recomeçar a vida. Mas só depois de tentar alcançar um plano de pagamentos ou outra solução que evite a insolvência. Regra geral, tal é possível de alcançar e o sucesso é grande nesta matéria. 

Isto sem prejuízo de casos limites em que as famílias apresentam quebras de rendimentos tão grandes (devido a desemprego, doença, divorcio etc.), que nem conseguem apresentar um plano de pagamentos ao credores pois não lhes sobra nem dispõem de dinheiro para o efeito.  Neste caso, em tempo e nos prazos legais, é recorrer a insolvência e tentar obter o perdão das dívidas, mas utilizar esta possibilidade com sensatez e como último recurso. E conscientes do que se está a fazer e que outras soluções não foram possíveis.

Pois, com total inconsciência, andámos nós a viver durante anos sem assumir que não tinhamos salários reais face ao custo de vida…com a ajuda das instituições financeiras – ainda mais inconscientes que os clientes (As quais andaram anos a viver dos empréstimos habitações, multi-opções e dos fiadores).

Às famílias e pessoas singulares, que pertencem a esta estatística, cabe uma decisão consciente.

Na minha opinião, é pautar a decisão pela ordem que descrevo, conhecendo bem as soluções e os caminhos, sem acreditar em soluções de perdões milagrosos ao facilitismo da internet e às insolvências de centro comercial.

Tudo na vida tem consequências, e qualquer uma destas decisões terá repercussões familiares e pessoais, umas mais graves outras menos, mas todas interferem com a qualidade e bem estar familiar. E está será a barreira para escolher uma das opções…o bem estar e sobrevivência familiar.

Nunca ficar obrigado a algo que não se consegue pagar ou que coloca em causa a subsistência singular e familiar. Mas, na grande generalidade dos casos, é possível reunir o melhor dos dois mundos, sem virar as costas à responsabilidade…

Ou seja, alcançar um plano de pagamentos que evite males maiores. Tudo o resto, só será de equacionar uma vez falhada esta possibilidade ou nos casos em que não é possível de concretizar.

Em Portugal, e de acordo com a estatística, o salário médio ronda os 900,00 €. Aparentemente ….não se vive muito mal. Na teoria: Diz a estatística que tendo dois frangos e duas pessoas, temos um frango para cada um…Não é mau e ninguém passa fome. Somos um país de igualdades onde existe frango para toda a gente…Na prática. Um come dois frangos e o outro não come nada…Conclusão: Existem frangos para toda a gente…estão é mal distribuídos. É o que temos…

Luis M. Martins – Advogado

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