Porque Razão as Famílias Recorrem à Insolvência?

O aumento do consumo em Portugal, acompanhado pela facilidade na concessão do crédito, permitiu melhorar substancialmente o nível de vida da população. As pessoas, apesar dos baixos salários e uma vez endividadas, não conseguem lidar com situações de  redução de salário, divórcio, doença e desemprego (que afectam todo o agregado familiar), originando frequentemente o incumprimento dos compromissos assumidos.

A insolvência e os processos de regularização de dívidas com ela relacionados, acaba por ter dois fins: Possibilidade de restruturação financeira e familiar do devedor e suspensão das acções judiciais e cobranças em que é parte (penhoras, vendas e afins).

Este processo concretiza-se através de “planos de pagamentos” aos credores ou da “exoneração do passivo restante“, permitindo ao devedor extinguir as dívidas e não ficar onerado com as mesmas «ad eternum», isto porque, se a exoneração for concedida, ao fim de cinco anos dá-se a extinção dos créditos que ainda subsistam à data em que é concedida.

Estas são soluções que o devedor pode adoptar para “começar de novo” todavia, estamos perante processos judiciais que não devem ser encarados com a ligeireza que a internet já nos habitou… e as consequências são sérias quando as coisas não correm bem.

Pelos efeitos que acarreta, é sempre de evitar um processo de insolvência tendo em vista unicamente o perdão liminar das dívidas – Solução que deve ser encarada como último recurso.

Quem ainda tem condições e flexibilidade orçamental, deve sempre tentar a aprovação de um plano de pagamento que lhe vai permitir pagar aos credores e manter os seus bens (com a ressalva que quanto mais tempo a pessoa passa sem tomar uma atitude, maior será a bola de neve).

Nestas situações, há que ter sempre presente que o plano judicial pode prever moratórias, perdões, extinções totais ou parciais de capital e juros, redução e aumento de garantias reais ou privilégios creditórios, um programa calendarizado de pagamentos ou o pagamento numa só prestação, bem como a adopção pelo devedor de medidas concretas susceptíveis de melhorar a sua situação patrimonial.

Para as pessoas singulares, a insolvência representa um mecanismo judicial que permite a sua recuperação, libertando-as dos processos executivos, penhoras e pressões dos credores. Mas neste percurso, importa não esquecer que ninguém foi obrigado a contratar o crédito… pelo menos de forma coerciva.

E, neste pressuposto, o “plano de pagamentos” constitui a melhor forma de conciliar os interesses entre devedores e credores, existindo cada vez maior abertura dos credores – principalmente das instituições de crédito.

Não obstante, se posteriormente não for possível cumprir o plano, pelos mais diversos motivos, é sempre possível encetar um processo de insolvência tendo em vista um perdão das dívidas após os cinco anos de “bom comportamento”.

Atendendo às dificuldades de relacionada com desemprego, cortes de pessoal, redução de salários, etc…, levar ao conhecimento dos credores um plano de pagamentos permite ganhar folego para melhorar a situação familiar, estabilidade laboral e, sobretudo, ter tempo de pensar sem estar sob a pressão do telefone e das cartas endereçadas pelos credores.

As pessoas singulares recorrem à insolvência porque, bem conduzido o processo, permite a reorganização da pessoa e da sua estrutura familiar a par do cumprimento total ou parcial das obrigações assumidas. Os credores sabem, ou deviam saber, que mais vale um mau acordo que uma boa demanda….

Assim, o primeiro objectivo deve ser salvar a pessoa e o agregado familiar, conciliando os interesses dos credores com a responsabilidade social que assiste a todo o cidadão.

Se não for possível, há que avançar para um processo que visa somente o perdão das dívidas via “exoneração do passivo restante”, mas com a cabeça arguida, sem medo de dizer que tudo se fez para pagar e que, o recurso ao perdão da dívida, não foi uma solução, foi a última saída que a todo o custo se tentou evitar.

Ressalvando mais uma vez que o caminho mais fácil é sempre mais apetecível mas, optar por não pagar a quem se deve, quando se tem possibilidade de o fazer total ou parcialmente, não pode ser considerado solução para coisa nenhuma.

Importa definir em que lugar estamos na corrida e para onde queremos ir…Pois, da primeira posição à última, vai um grande passo….

A Legislação citada pertence ao Código de Insolvência e Recuperação de Empresas.

Luís M. Martins – Advogado

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