Processo Especial de Recuperação de Empresas (PER)

No que respeita à recuperação de empresas, o tecido económico empresarial português assiste a mais uma viragem – se tudo correr dentro da normalidade.

Como é sabido, mudam-se os tempos e os partidos, mudam-se as vontades e as leis.

Em 2004, o governo de então, aprovava o Código de insolvência e Recuperação de Empresas (CIRE), determinando no ponto 3 do preâmbulo do DL n.º 53/2004, de  18 de Março: “Sendo a garantia comum dos créditos o património do devedor, é aos credores que cumpre decidir quanto à melhor efetivação dessa garantia, e é por essa via que, seguramente, melhor se satisfaz o interesse público da preservação do bom funcionamento do mercado (…) E, repise-se, essa estimativa será sempre a melhor forma de realização do interesse público de regulação do mercado, mantendo em funcionamento as empresas viáveis e expurgando dele as que o não sejam (ainda que, nesta última hipótese, a inviabilidade possa resultar apenas do facto de os credores não verem interesse na continuação).”

Ideologia reforçada no ponto 6 do preâmbulo ao esclarecer: “…O novo Código acolhe esta estrutura, como logo resulta do seu artigo 1.º e, por outro lado, do artigo 192.º, que define a função do plano de insolvência. Fugindo da errónea ideia afirmada na atual lei, quanto à suposta prevalência da via da recuperação da empresa, o modelo adoptado pelo novo Código explicita, assim, desde o seu início, que é sempre a vontade dos credores a que comanda todo o processo. A opção que a lei lhes dá é a de se acolherem ao abrigo do regime supletivamente disposto no Código — o qual não poderia deixar de ser o do imediato ressarcimento dos credores mediante a liquidação do património do insolvente ou de se afastarem dele, provendo por sua iniciativa a um diferente tratamento do pagamento dos seus créditos…”

Mas isto foi em 2004….Na altura, uma empresa em situação difícil e impossibilidade de cumprir feria a concorrência e a auto-regulação dos mercados pelo que, devia ser retirada do mercado…Muitas vezes escrevi que se não ajudassem as empresas que estão com dificuldade…pouco vai sobrar. É que, mesmo com dificuldades e em incumprimento, sempre vão criando trabalho e movimentam a economia”.

Quem conhece a situação real das empresas (pme´s na sua maioria) sabe que já em 2004 estas passavam um mau bocado. E que, se acabassem com aquelas que sobreviviam, estava a cometer-se um erro – pois nada iria sobrar!

Em finais de 2011, na exposição de motivos da proposta de lei 39/2011, que veio operar a sexta alteração ao CIRE, o legislador veio mudar de ideias e olhar para o que está mal  – apesar de não anunciar que as empresas estão a sucumbir nas mãos dos bancos e do Estado.

Se matarmos as empresas em dificuldades que ainda resistem… não vai sobrar tecido empresarial em Portugal.  A lei dá nota disso mesmo “…A presente situação económica obriga, com efeito, a gizar soluções que sejam, em si mesmas, eficazes e eficientes no combate ao “desaparecimento” de agentes económicos, visto que cada agente que desaparece representa um custo apreciável para a economia, contribuindo para o empobrecimento do tecido económico português, uma vez que gera desemprego e extingue oportunidades comerciais que, dificilmente, se podem recuperar pelo surgimento de novas empresas. Este processo especial permite ainda a rápida homologação de acordos conducentes à recuperação de devedores em situação económica difícil celebrados extrajudicialmente, num momento de pré-insolvência, de tal modo que os referidos acordos passem a vincular também os credores que aos mesmos não se vincularam, desde que respeitada a legislação aplicável à regularização de dívidas à administração fiscal e à segurança social e observadas determinadas condições que asseguram a salvaguarda dos interesses dos credores minoritários…”

Assim, vem agora o Estado “paternalista”, anunciar que se importa com as empresas: “O principal objetivo prosseguido por esta revisão passa por reorientar o Código da Insolvência e Recuperação de Empresas para a promoção da recuperação, privilegiando-se sempre que possível a manutenção do devedor no giro comercial, relegando-se para segundo plano a liquidação do seu património sempre que se mostre viável a sua recuperação.”

É bom que o Estado assuma essa paternidade pois tecido empresarial está muito pior do que o anunciado nos meios de comunicação.

Verdade seja dita, a resolução do Conselho de ministros n.º 11/2012, de 3 de fevereiro, que cria o “Programa Revitalizar”, traça uma realidade do tecido empresarial português verdadeira, inquietante e preocupante… “A deterioração do contexto económico e financeiro, nacional e internacional, e a consequente desalavancagem generalizada da banca, vieram agravar as fragilidades das empresas em Portugal, em particular das pequenas e médias empresas (PME), o que resultou no aumento da morosidade no cumprimento das respetivas obrigações contratuais e incumprimentos efetivos.  De uma forma geral, as empresas nacionais apresentam uma estrutura financeira desequilibrada, com elevada dependência do financiamento de terceiros, em particular da banca, e possuem capitais próprios inferiores ao desejável. Adicionalmente, as empresas têm, na maioria dos casos, uma estrutura de governação pouco profissionalizada, nem sempre alinhada com as melhores práticas de governança e apresentam uma estrutura acionista de matriz e natureza familiar.  A situação acima mencionada tem um impacto direto na região em que as empresas se encontram estabelecidas, conduzindo à destruição de emprego e desestruturando subsequentemente o equilíbrio socioeconómico aí existente, prejudicando os objetivos de coesão territorial.”

Conclusões que não podem ser mais verdadeiras…

Cria-se assim um mecanismo que permite às empresas regularizar os compromissos assumidos para com os seus credores de forma preventiva, antes de entrarem numa situação irreversível de insolvência visando a sua liquidação. Neste sentido, é criado o processo especial de revitalização, aditando-se os arts.  artigos 17.º-A a 17.º-I ao CIRE, com o objetivo de propiciar a revitalização do devedor em dificuldade e regularização das dividas existentes.

O PER – Processo Especial de Revitalização, tem assim como destinatários as empresas em situação económica difícil e de insolvência iminente, criando um instrumento alternativo à insolvência que se anuncia mais ágil e mais eficaz para a sua proteção e recuperação.

Este mecanismo “…pretende assumir-se como um mecanismo célere e eficaz que possibilite a revitalização dos devedores que se encontrem em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente mas que ainda não tenham entrado em situação de insolvência atual (…)O processo terá o seu início com a manifestação de vontade do devedor e de, pelo menos, um dos seus credores, no sentido de se encetarem negociações, que não poderão exceder os três meses. Durante este período, suspendem-se as ações que contra si sejam intentadas com a finalidade de lhe serem cobradas dívidas, assegurando-se, assim, a existência da necessária calma para reflexão e para criação de um plano de viabilidade para o devedor que se encontre em negociações…”

Ou seja, muda-se totalmente os intuitos e desígnios do CIRE apostando numa “anunciada” recuperação e revitalização das empresas em dificuldades, em contraponto com a sua liquidação/desmantelamento.

A tónica é simples, a empresa em dificuldades pode tentar obter, extra judicialmente e numa primeira fase, aquilo que mais se almeja quando se está numa situação econômica difícil: proteção da  capacidade produtiva da empresa, manutenção dos postos de trabalho, suspensão das cobranças de créditos até aprovação de um  plano de recuperação e  reestruturação da dívida.

As negociações terão a duração máxima de 60 dias, prorrogável, em certas condições legalmente estabelecidas, por mais 30. Uma vez aprovado, o plano é  homologado por um juiz num prazo de 10 dias e torna-se vinculativo para todos os credores.

Procedimentos que podiam ter ido um pouco mais longe como veremos num próximo artigo, nomeadamente:

– Disciplinar e colocar os créditos do estado nos processos de insolvência igual aos demais – em regra, são credores em todos os processos e sem grande flexibilidade. Antes pelo contrário deixou-se claro que com o Estado não e possível negociar fora dos moldes previstos na lei tributária. Quem tenta recuperar empresa sabe o peso que estes créditos assumem nos processo;

– Afastar a insolvência e matéria com ela relacionada do PER;

– Não é necessário um administrador provisório no PER. Só quem não trabalha nestes processos acredita nessa realidade e na sua intervenção. Nem a empresa precisa de um terceiro a gerir a sua atividade (Se esta não eles não o fizer ninguém faz). A intervenção do Administrador judicial provisório devia ser alternativa mediante solicitação da empresa ou imposição dos credores…a quem cabia definir a sua remuneração.

Em resumo, o procedimento assume as seguintes fases e tramitação (Fonte: Ministério da Justiça):

Continua….

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